
Cientistas brasileiros ficaram horrorizados com uma redução de 44% no orçamento federal de ciência, anunciado pelo governo do país em 30 de março. Depois de anos de austeridade, os pesquisadores temem que o último corte dramático destrua a ciência do país.
Isso deixará o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) com seu orçamento mais baixo em pelo menos 12 anos, com apenas 2,8 bilhões de reais, equivalente a US$ 898 milhões — um corte de 2,2 bilhões de reais dos 5 bilhões de reais do financiamento que o governo tinha proposto originalmente para 2017 (veja “cortes drásticos”, na tabela mais abaixo).
O corte é parte de um corte geral de 42 bilhões de reais do orçamento federal, o que equivale a 28% sobre todos os departamentos governamentais — por isso o corte para a ciência é particularmente grave. O presidente Michel Temer diz que a medida foi uma resposta difícil, mas necessária, ao crescente déficit fiscal do Brasil. O país enfrenta a pior recessão da sua história e a recuperação tem sido muito mais lenta do que o esperado: as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para 2017 foram revistas de 1,4% para 0,5% no mês passado.
Os pesquisadores argumentam que a ciência já teve um peso muito grande da crise econômica. Desde 2014, uma série de cortes de recursos significou abandonar um programa de intercâmbio emblemático para permitir que estudantes brasileiros visitassem instituições líderes no exterior e grandes projetos — como o síncrotron Sirius, uma máquina de 1,75 bilhão de reais. O número de trabalhos de pesquisa publicados no Brasil também está diminuindo, segundo uma estimativa preliminar de 2016.
Somando-se a essas desgraças, Temer demoliu o Ministério da Ciência quando ele tomou posse em maio de 2016 e fundiu-lo com o Ministério de Comunicações. Uma emenda constitucional aprovada pelo novo governo limitou os gastos federais a aumentos no nível da inflação por 20 anos, matando a esperança de que a maré possa virar em breve.
Cientistas fugindo
“O novo orçamento é uma bomba atômica contra a ciência brasileira.”, diz o físico Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências. Ele adverte que os cortes prejudicarão a pesquisa e o desenvolvimento nas próximas décadas. “Se estivéssemos em guerra, poderíamos pensar que essa era uma estratégia de uma potência estrangeira para destruir nosso país. Mas, em vez disso, somos nós fazendo isso para nós mesmos.”
Sidarta Ribeiro, chefe do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em Natal, no Brasil, tem uma visão apocalíptica semelhante, dizendo: “Este é um ato de guerra contra o futuro do Brasil. Os cientistas vão fugir do país.”. Ele cita o caso de Suzana Herculano-Houzel, renomada neurocientista que fechou seu laboratório em 2016 e deixou o Brasil para os Estados Unidos. “Se eu não tivesse dinheiro estrangeiro para pesquisar eu estaria me desligando.”, acrescenta.
Cortes drásticos: a queda do orçamento para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações brasileiro chegará a um novo patamar em 2017. (Créditos da imagem: Nature).
Fernando Peregrino, presidente da CONFIES, Associação Brasileira de Agências de Fomento à Ciência e Fundações Universitárias, concorda. “Haverá um enorme desmembramento de equipes que será difícil de reconstruir.”, diz ele. “Nós subimos mais um passo para baixo.”. Os cientistas estavam preocupados com o financiamento antes do anúncio.
Davidovich e Helena Nader, presidentes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), escreveram de forma preventiva cartas a Temer e ao ministro das Finanças, Henrique Meirelles, alertando sobre o impacto de um corte potencial em um já apertado orçamento científico . “O governo agiu sem ouvir o Estado. Mostra uma miopia absoluta.”, diz Nader.
MCTIC disse à Nature que já começou a avaliar o impacto total dos cortes. De acordo com o ministério, as ações para mitigá-los serão anunciadas em breve.
Ribeiro diz que os cortes drásticos podem ter um forro de prata: podem alimentar a marcha de 22 de abril para a Ciência no Brasil. A SBPC uniu-se formalmente à marcha deste mês, inspirada pelo movimento Trump-resistance nos Estados Unidos, e tem chamado os cientistas de todo o Brasil a se juntarem. “Precisamos pintar para a guerra e ocupar espaços públicos.”, diz Ribeiro. “Respeitosamente, mas consistentemente.”