Um análise de quatro corpos gelados descobertos no Sistema Solar exterior não revela sinais de que eles estão sendo influenciados por um planeta grande e invisível à espreita além de Netuno. O achado enfraquece uma linha de evidências para um suposto “nono planeta” proposto em 2014 com base no agrupamento de objetos em uma região chamada de cinturão de Kuiper, argumenta uma equipe de astrônomos em um artigo publicado pela primeira vez no site arXiv no dia 16 de junho.
Os objetos foram encontrados por pesquisadores liderando a Pesquisa das Origens do Sistema Solar Exterior (OSSOS, na sigla em inglês), que estuda a região do espaço para além de Netuno. Os corpos que despertaram o interesse dos astrônomos moram nos confins do cinturão de Kuiper.
Usando o telescópio de 3,6 metros de Canadá-França-Havaí em Mauna Kea, Havaí, a equipe descobriu quatro objetos que orbitam o Sol em elipses enormes com ao menos 250 unidades astronômicas (ua) de largura. Uma ua é o equivalente à distância entre a Terra e o Sol; Netuno orbita a cerca de 300 uas. Cerca de 12 objetos de grandes órbitas foram encontrados até agora, incluindo os quatro descobertos pela OSSOS.
Os argumentos para o nono planeta são baseados no agrupamento de seis daqueles objetos de órbita grande previamente conhecidos. Estudos feitos por outras duas equipes de pesquisa, os quais se basearam em múltiplas pesquisas astronômicas, descobriram que seis objetos eram agrupados em dois grupos. Ambas as equipes sugeriram que a gravidade de um planeta invisível, talvez com dez vezes a massa da Terra, havia levado os objetos a esses curiosos arranjos.
Grupos que desaparecem
Cientistas concordam que as pesquisas astronômicas que revelaram os seis objetos não foram irretocáveis, diz Cory Shankman, astrônomo na Universidade de Victoria no Canadá e principal autor do último estudo. Cada uma delas teve que lidar com visibilidade reduzida devido ao mau tempo em algumas estações, e com fato de que é mais fácil observar objetos do cinturão de Kuiper que estejam mais distantes do plano da Via Láctea. Tais fatores podem levar os astrônomos a detectar mais objetos em certas partes do céu do que em outras, mesmo quando os objetos estão distribuídos uniformemente, segundo Shankman. É possível corrigir esses vieses utilizando métodos estatísticos, mas a maioria das pesquisas anteriores não informou tê-los usado.
A equipe da OSSOS argumenta que esses vieses poderiam ter levado a falsas indicações de agrupamento. “Estavam construindo todo esse argumento a partir de seis objetos com vieses desconhecidos quanto ao modo como foram detectados”, diz a astrônoma Samantha Lawler, do Conselho Nacional de Pesquisa do Canadá em Victoria, “o que é um jogo perigoso se de jogar.”
Três dos objetos encontrados pela OSSOS pareciam estar nos dois agrupamentos previamente identificados. Contudo, quando os autores do estudo levaram em consideração o fato de sua pesquisa encontrar preferencialmente objetos em certas partes do céu em certos momentos do ano, a evidência de agrupamento desapareceu, diz Shankman.
O caso do nono planeta
Vieses em pesquisas anteriores enfraquecem o caso do nono planeta no tamanho e na distância propostos, diz Renu Malhorta, astrônoma da Universidade do Arizona em Tucson. Entretanto, ela acrescenta que a equipe da OSSOS não provou que esses vieses realmente realcem o agrupamento entre objetos do cinturão de Kuiper distantes; então, o artigo faz pouco no sentido de mudar o debate.
Scott Sheppard, astrônomo na Instituição Carnegie para Ciência em Washington e parte da equipe que primeiro sugeriu a presença de um planeta invisível, concorda. Mesmo com os novos dados, a melhor explicação para o agrupamento incomum dos objetos do cinturão de Kuiper é um planeta, ele diz.
E mesmo se pesquisas anteriores tivessem problemas, elas ainda assim poderiam ter detectado evidências da existência um planeta grande, diz Konstantin Batygin, astrônomo do Instituto de Tecnologia da Califórnia em Pasadena e membro de outro time que propôs a existência do nono planeta.
Além disso, os agrupamentos são só uma linha de evidência para um nono planeta, segundo ele. A descoberta de objetos do cinturão de Kuiper que não estão vinculados a Netuno, e outros com órbitas quase perpendiculares àquelas da maioria dos objetos do Sistema Solar, são mais facilmente explicadas pela presença de um grande planeta no Sistema Solar exterior, acrescenta Batygin.
Segundo Malhorta, o que resolverá, enfim, a questão do nono planeta serão mais dados de telescópios atuais e futuros. “Realmente estamos trabalhando às margens do que é tecnicamente factível com observações do Sistema Solar exterior”, ela diz. “Estamos realmente empurrando os limites daquilo que é possível de se detectar.”
Gabriel Popkin, Nature
Este artigo é reproduzido com permissão e foi publicado primeiramente no dia 22 de junho de 2017.
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